quarta-feira, 31 de março de 2010

Calminha, com agulhas

"E bate louco, bate criminosamente

O coração mais do que a mente, bate o pé mais do que o corpo poderia
E se você mentalizasse na folia
Sabe lá se não seria a solução prá de manhã pensar melhor
E caso fosse a incompatibilidade entre o corpo e consciência
Iria desaparecer, você não vê
Como o corpo preparado pode ser iluminado
Como a luz de uma fogueira que precisa se manter"
Oswaldo Montenegro


Há umas duas semanas, cheguei ao trabalho parecendo um zumbi. Olheiras, sono e o peso do mundo nas costas. É que ando dormindo mal e pouco, dando conta, como tantas outras mulheres, de casa, trabalho e muitas demandas que surgem no atropelo do cotidiano. Uma amiga me socorreu, sugerindo um café forte e uma massagem no horário de almoço. O café deu aquela levantada no astral e a massagem, bem... Procuramos uma clínica de terapias alternativas próxima ao lugar onde trabalhamos, mas o dono, um senhor oriental contador de histórias, disse que massagem ele não fazia. Fazia acupuntura. Minha amiga, animada com a ideia, sugeriu que eu experimentasse. Logo de cara o tal senhor olhou pra mim e decretou, num português truncado: "Você está com 'probrema' de energia". Saiu de cena e voltou com uma espécie de triângulo de metal e confirmou o diagnóstico. Não tive argumentos.
Já fiz três sessões. Estranho ficar deitada na maca enquanto alguém nos espeta com agulhas finíssimas pelo corpo. Mas estranho ainda tentar relaxar com tais agulhas. Incomoda a fixação. Senti uma dor semelhante ao da picada de uma agulha de injeção, embora eu saiba que essas são da espessura de um fio de cabelo. Lembro daquele filme de terror, o Hellraiser, com seus rostos cheios de agulhas, e tenho vontade de rir. Desculpe, sei que a terapia é séria. Cômica é a situação.
Para quem tentou até psiquiatra para se livrar do estresse e da Síndrome da Pressa, ando atipicamente calma nas últimas semanas. Ainda me sinto cansada, o que tentei resolver com mais exercícios, a natação, mas que me dá um incrível prazer. É, digamos, um cansaço bom, positivo, que renova as energias. Eu aposentei por algum tempo as vitaminas de pré-natal (eu amamento meu filho de sete meses e resolvi doar leite para um banco) e preciso voltar a investir nelas como um "seguro-saúde".
Tentei estudar mais sobre terapias alternativas, mas confesso: não é coisa fácil entender aqueles termos chineses e indianos, e como funcionam meridianos, chakras, auras... Não desisti, mas não avancei muito nos conhecimentos que gostaria de adquirir. Nem mesmo a básica meditação eu consegui implantar no meu dia-a-dia.
O fato é que me sinto melhor, aos trancos e barrancos. Se posso atribuir isso às agulhitas, não sei. Apesar disso, estou quase por desistir porque o terapeuta fala demais (é duro para quem gosta de tagarelar ficar só como ouvinte). E também porque a acupultura dói um pouco no meu orçamento.
Para retribuir a gentileza da minha amiga, descobri um clínica aqui perto que oferece a massagem anti-estresse. Acho que vou marcar para experimentarmos.

sexta-feira, 5 de março de 2010

Mulher, mulher

"Dizem que a mulher é o sexo frágil. Mas que mentira absurda! Eu que faço parte da rotina de uma delas, sei que a força está com elas" - Erasmo Carlos

Eu nunca tinha prestado muita atenção nesta música, que sempre é usada em trilhas sonoras de rádios no Dia da Mulher, até ler um artigo num site de astrologia. Não só achei que tem tudo a ver com o mundo feminino como me identifiquei com a mulher em questão, que tenta dar atenção ao marido enquanto amamenta o filho menor, dá a mão para o do meio e expressa seu amor pelo mais velho. Também tenho quatro homens "dependentes e carentes" em casa, como diz a canção do Erasmo.
Pode parecer chavão, mas quero aproveitar a data para celebrar a feminilidade e dizer que, embora envolvidas em mil atribuições, nós, mulheres, temos o poder de mudar o mundo. Criar pessoas mais amorosas, sensíveis, incapazes de violentar a natureza e de cometer crimes. Cidadãos conscientes que lutem por justiça, diminuindo o enorme abismo entre as classes sociais. Pais e mães dedicados à prole, participativos nas escolas. Políticos honestos e altruístas. Profissionais motivados e idealistas.
Parece sonho? Pois não é. Mulheres estão nos lares, nas escolas, nas comunidades. Neste momento cuidam de crianças nas creches, lecionam, percorrem comunidades para levar a multimistura da Pastoral da Criança a bebês desnutridos, perambulam por bairros pobres como agentes de saúde. Elas têm o poder de conceber, gestar... uma criança, projeto, ideia, bandeira. Seus frutos ultrapassam a fronteira do ventre. Como solo fértil, coração de mulher germina solidariedade e sempre tem lugar pra mais um.
Apesar de tão fundamental à vida, a mulher vem sendo negligenciada. Por homens, que ainda a agridem em atos de absurda covardia, protegidos pelo silêncio de quatro paredes. Pela sociedade, que é injusta quando pratica preconceitos que já deveriam ter sido banidos. Por outras mulheres, quando dão eco a visões machistas e não amparam a maternidade. Por elas próprias, quando sufocam desejos, impedem ousadias, pregam o conformismo, desrespeitam seus limites.
Aproveitando a data, quem sabe as mulheres consigam perceber o quanto especiais são. Que deixem os rótulos de lado e olhem no espelho sem se preocupar com rugas, celulite, estrias e cabelos brancos. Esqueçam padrões de beleza. Rasguem a cartilha do feminismo, porque não é competindo com os homens ou tentando ser como eles que vão fazer a diferença. Não reforcem a ignorância, desestimulando o parto natural e o aleitamento materno, dádivas da mãe-natureza.
Espero que as mulheres adoeçam menos por estresse, abandonem a frenética busca por perfeição. Não se cobrem por serem falíveis, às vezes frágeis e quase sempre fora de si nos dias de TPM, na chegada da menopausa, após dar a luz. Sou assim e se encontrasse o gênio da lâmpada teria apenas um desejo: ser perfeita. Morro quando um filho meu fica triste, quero cair num buraco quando erro e não dou trégua no trabalho. Queria ser a Mulher-maravilha, com capa e tudo, ah, e lógico, aquele corpão.
Mulher é assim. Nosso desafio deve ser olhar para as nossas próprias necessidades, e não falo só do shopping. Necessidades que fingimos não perceber, aquelas escondidinhas lá dentro do peito, que emergem quando finalmente repousamos a cabeça no travesseiro. Queremos colo, atenção, ouvidos, um divã, reconhecimento, amor. E não só no Dia da Mulher, mas nos outros dias do ano, que tenhamos a reconhecida reverência pelo que temos a ofertar, nossa contribuição para um mundo melhor. Mas essa construção é feita a quatro mãos, homem e mulher, unidos como iguais, respeitando suas diferenças.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Seja ridículo

"Eu vi... pois é, eu reparei. Você me tirou todo o ar, pra que eu pudesse respirar. Eu sei que ninguém percebeu. Foi só você e eu" (Cupido, por Maria Rita)


Faz tempo que não sinto aquela sensação de parar no tempo. Incrível como acontece à nossa revelia, os sentimentos nos carregam como o quebrar de uma onda gigante, nos arrastam como vento em fúria e não temos foco para mais nada. Tudo ao redor some e só o que importa é aquele momento - mágico, eterno, intenso.
A paixão costuma ser assim. Não apenas por aquela pessoa atraente, cuja força do olhar nos encanta com um poder avassalador. Ela nos faz refém quando estamos absortos num trabalho envolvente, numa dança, numa ideia criativa (os tais insights, ou em plena brainstorming, literalmente tempestade cerebral, que digam os publicitários) ou diante de numa cena cativante, o que me lembra aquele trecho da canção "O Leãozinho", do Caetano: "E um filhote de leão, raio da manhã, arrastando o meu olhar como um ímã". Pode ser paixão por um bebê lindo, que sorri em nosso colo e nos faz derreter, começar a balbuciar um "bebenês" e parecer ridículos.
Sim, ridículo é a palavra exata. Apaixonados, somos completamente sem noção e isso me parece fundamental para viver a vida com mais alegria, botar cor no que está cinzento, sabor no que está sem gosto, dar leveza ao cotidiano. As regras sociais, de comportamento, obrigações da boa educação, rígidos padrões, nos forçam a prestar atenção a tudo, responder quando chamados, sempre alertas, como os escoteiros, sempre formais. Tudo certinho, dentro do previsto, programado.
A espontaneidade nos vem sendo podada desde a infância e não nos damos conta. Aí, do nada, certo dia nos flagramos flertando descaradamente com alguém, aquela força interior emergindo e, no olho do furacão, encontramos a paz. De vez em quando, numa aula tediosa ou na poltrona do ônibus, reparamos o mundo de uma janela e dá vontade de estar lá, entre as crianças que correm na chuva.
Bem-vindo à vida! Permita-se esquecer o relógio em casa, cabular um dia de trabalho, paquerar alguém, brincar com uma criança no parque. Ser assim, completamente ridículo e feliz. Porque ninguém vai reparar, e se reparar, você não vai perceber porque não estará nem aí para o que os outros pensam, para o que a moral e os bons costumes pregam, para o que o mundo dita, para o que diz a meteorologia.
Se conseguir ser ridículo mais vezes, vai acabar se tranformando. A metamorfose mudará o eixo do teu ser, do cérebro para o coração, que baterá mais rápido. A respiração ficará mais profunda, oxigenando melhor as células. Um sentimento de bem-estar dará o acabamento final: um rosto radiante, bochechas ruborizadas, olhos brilhantes. E se alguém disser que você anda nas nuvens ou no mundo da Lua, apenas sorria. Um sorriso largo, verdadeiro e contagiante.