terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Sobre sonhos

“Longe se vai sonhando demais, mas aonde se chega assim?”
(Milton Nascimento)

Se por um lado devemos cultivar nossos sonhos e concretizá-los, por outro não podemos viver só de sonhos. Há uma diferença enorme entre traçar um planejamento para atingir metas, seja trocar de carro ou comprar um imóvel, e viver praguejando porque não se consegue um emprego melhor.
Quem sonha demais, esquece a realidade e vive a vida sem viver. Mas quando mantém vivos os sonhos sem se desconectar do mundo real, vive com mais alegria e entusiasmo. Sem eles, o cotidiano se torna rígido e chato.
Falando em sonhos, essa é uma boa maneira de se reencontrar. Pegue uma foto antiga e veja. Examine bem aquela criança porque ela ainda é você. Lembre-se do que, naquela época, queria fazer no futuro e faça, se isto for importante hoje.
Mas sonhar como fuga da realidade é o que milhões de pessoas fazem sem se dar conta. No trânsito, sonhando com um carro novo, sem observar as dificuldades de quem depende de transporte público. No emprego, sonhando com uma promoção e melhor salário, sem notar que é preciso trabalhar com mais energia, mostrar resultados que justifiquem isso ou batalhar outro lugar. No espelho, sonhando com quilos a menos, mas sem encontrar disposição de fazer exercícios e adotar uma dieta.
A médica norte-americana Pamela Peeke, autora de “Body for Life para Mulheres”, chama esse tipo de condicionamento de vala da ruminação. Não reclame, aja. Não sonhe apenas, concretize. Adote uma atitude realista e mude o que não o satisfaz combinando a força do pensamento com a da ação. Saia da vala da ruminação, parafraseando a dra. Peeke, deixe a zona de conforto, e chegue aonde quer chegar.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

O valor da vida

“Vem de lá
Nenhum lugar
Espaço além, do coração
Vem na luz do sol
O vento traz
Nudez de tal revelação”
(“Anjo Bom”, Flávio Venturini)

Afinal, corremos para quê? Esta é a pergunta que me faço diante de tragédias como a do Haiti. Ali, entre escombros, vidas soterradas. Pessoas que até o terremoto acontecer trabalhavam, estudavam, levavam seu cotidiano normalmente, quem sabe felizes. E que hoje choram seus mortos, perambulam entre prédios destruídos, sentam no chão e tentam buscar recursos, do fundo da alma, para se recompor e curar feridas que talvez nunca cicatrizem.

Estamos sempre apressados e passamos pela vida como zumbis, sem prestar atenção ao presente, a quem está do nosso lado, a pequenas alegrias, tão discretas e frágeis que se perdem no mar agitado dos nossos pensamentos. E eis que um dia algo acontece, ou não. O diagnóstico de uma doença grave, a morte de um ente querido, um trauma ou uma tragédia que nos faça parar. Reparem que sobreviventes dão um valor muito maior à vida, mudando completamente de atitude. Tornam-se pessoas melhores. Não precisamos passar por isso para revolucionar nossa vida.

Recentemente assisti a um vídeo em que o palestrante discorria sobre felicidade e comparava ganhar na loteria a se tornar um paraplégico. Claro que ninguém quer ficar sem os movimentos das pernas e todos querem ter dinheiro o bastante para realizar seus sonhos, mas, segundo ele, nas pessoas estudadas, algum tempo depois o nível de felicidade nos dois casos era o mesmo. O palestrante atribuía isso ao fato de nos contentarmos com o que temos se não tivermos escolhas. Quando temos muitas opções, tendemos a não nos satisfazermos nunca, como alguém que, por ter tudo, não encontra felicidade em nada, condenado a uma eterna busca por mais e mais.

As câmeras de tevê nos mostram que as pessoas no Haiti que sobreviveram ao terremoto não têm escolhas. A vida foi o que lhes restou, e só. Para muitos, isso basta. Vejo num site a foto de um soldado espanhol entregando uma criança de dois anos à mãe. O soldado exibe um sorriso triste, como que escurecido pelo pesar das cenas horríveis que viu. A criança também não sorri abertamente, apenas seus olhos, negros e grandes, traduzem o contentamento de ter a mãe ali tão próxima. Não se pode ver a expressão da mãe porque ela está de costas, mas sua mão, indo ao encontro do rosto do filho, sorri por ela, com ternura e paz.

A mesma paz que marcou a trajetória da amada Zilda Arns neste mundo. Aos 75 anos, morreu de forma heróica, lutando pelo que acreditava, mas viveu de forma ainda mais heróica, salvando vidas com receitas simples de uma mistura de farelo de cereais e de água com sal e açúcar. Um anjo lindo que passou pela Terra espalhando justiça e solidariedade.

Vamos parar um pouco, fazer um minuto de silêncio em respeito aos que se foram e em homenagem aos bravos que tentam viver em meio ao caos. E que este silêncio se prolongue por nossas mentes inquietas, corações ansiosos e pernas apressadas.

Devemos dar graças a Deus pelo que temos, ter a humildade de aceitar o que não podemos mudar e amar muito. Porque nesta vida, só o amor importa. O amor de Zilda Arns pelas crianças pobres, o amor daquela mãe ao reencontrar o filho, o amor do soldado que enfrenta o perigo para resgatar desconhecidos que falam outra língua e o amor que temos para mudar o mundo ao nosso redor.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Mãos na terra

“Afagar a terra, conhecer os desejos da terra
Cio da terra, a propícia estação
E fecundar o chão”
(“Cio da Terra”, Milton Nascimento e Chico Buarque)



Representando abundância e fertilidade, a terra é um elemento poderoso que, entre outras coisas, nos ajuda na busca pela tão necessária calma. Simplesmente pisá-la com pés descalços, sentir seu cheiro após a chuva, nos faz parar por um momento e deixar de ser isto ou aquilo para assumirmos apenas a condição de seres vivos. Se a vida humana começa na água, termina na terra para ressurgir em outras formas. Mãe generosa, recebe e transforma, nutre e desenvolve.

Sugiro então que você arregace as mangas e procure um pedacinho de terra. Nem precisa ser quintal ou sítio. Basta um vaso. Plante ali o que quiser: de uma horta para colher alimentos para o estômago a um jardim de rosas, que alimenta a alma. Pode ser apenas um pé de feijão, uma árvore que se tornará frondosa ou uma muda de manjericão. Basta a semente da fruta que você acabou de comer, o pedaço do caule com raiz de uma salsa que ia para o lixo, aqueles envelopes de sementes que se encontra no supermercado ou saquinhos com plantas nas feiras livres. Uma folha de begônia ou de violeta é capaz de se multiplicar e algumas espécies de plantas pegam por galho, inclusive a roseira.

Cuide bem do seu pequeno agroprojeto. Sol, água e adubo são imprescindíveis, nas quantidades recomendadas a cada espécie. Ah, e paciência. Aí entra o treino contra a pressa. Nada na natureza acontece fora de época, há tempo para tudo. Então se prepare para todo dia visitar sua planta com aquela expectativa e... Nada. Até que um dia, quando você já nem achava mais que ela brotaria ou daria flores, descobre um minúsculo botão, uma folhinha, um pedacinho de vida. É como uma gravidez - o ultrassom revelando aquele pequeno ser, do tamanho de um grão de feijão, implantado no útero.

E o prazer vai aumentando à medida que a muda cresce: imagine saborear uma salada com verduras direto da horta, uma sopa com legumes frescos, temperar a comida com ervas verdes ou uma suculenta fruta. Tudo orgânico, sem agrotóxicos. Diz se não tem uma energia diferente...

Outro exercício relacionado à terra pode ser esculpir em argila, modelar a massa disforme e criar o que quiser. Liberte-se como na infância, sem autocrítica e julgamentos. São atividades simples que produzem um efeito terapêutico excelente, aumentando nossa qualidade de vida.

Que o ser humano tenha sensibilidade para amar a natureza, em seus pequenos detalhes. E a terra, que dá nome do nosso planeta água, nos inspire a sermos mais generosos e desapegados a cada estação.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Promessas de Ano-novo

"Faça uma lista de grandes amigos
Quem você mais via há dez anos atrás
Quantos você ainda vê todo dia
Quantos você já não encontra mais...
Faça uma lista dos sonhos que tinha
Quantos você desistiu de sonhar!
Quantos amores jurados pra sempre
Quantos você conseguiu preservar...
Onde você ainda se reconhece
Na foto passada ou no espelho de agora?
Hoje é do jeito que achou que seria
Quantos amigos você jogou fora?"
("A Lista", Oswaldo Montenegro)

Todo ano, refazemos a mesma lista de promessas: desacelerar, procurar velhos amigos, comer menos, fazer exercícios, parar de fumar... Mas no correr dos dias, semanas e meses, elas nunca se concretizam.
Neste alvorecer de 2010, vou esquecer as promessas. Fazer um tratado comigo mesma. Sem o rigor das coisas impostas, das regras, dos objetivos tão irreais. O compromisso é colocar o bem-estar em primeiro plano, buscar qualidade de vida e alegria. Livre assim, sem entrar em detalhes, enumerações.
Minha médica costumava dizer "Se você estiver bem, tudo e todos ao teu redor estarão também". Quando estamos felizes, somos melhores. Então que esta seja nossa única meta.